"Venham aqui todos os ladrões do mundo. Tenha cada um tantas mãos como o Briareu Centímano em cada mão outras tantas unhas. Não fique unha que aqui não venha a este exame. Pesquem, cacem, empolguem e pilhem tudo quanto quiserem, ouro, prata, pérolas, jóias de pedraria mais preciosa, ofícios, benefícios, comendas, morgadios, títulos, honras, grandezas até não mais, e vamos por ordem discutindo tudo.
Nascestes neste mundo nu (que assim nascem todos), abristes os olhos e vistes que com as riquezas medram os poderosos: desejastes logo ser um deles e tratastes de juntar as riquezas com que os poderosos incham.
Esperai: não furteis para as haverdes; eu vo-las dou todas porque só tratamos aqui, por ora, fazer a experiência que vou discursando, para cairdes no desengano, que trato de vos intimar. e se as tendes já porque as adquiristes, servindo, chatinando e roubando, que tudo vem a ser o mesmo - dizei-me, agora, se vos falta mais alguma coisa. Depois de vos verdes com grande cabedal, que é o que pretendeis?
A Arte de Furtar. Anônimo do século XVIII. Editora L&PM, 2005, p. 295-296.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não serão aceitas mensagens preconceituosas.